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2007/11/28

Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte VIII – N.º 06 – CAMINHANDO PARA O FRACASSO? 

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Carvalho da Silva, o negro devoto de Salazar, nunca soube como, apesar das cautelas referidas, a notícia do seu almoço com o Mestre, seguido de comício em absoluto inusitado, chegou ao conhecimento dos seus colegas da faculdade de Medicina de Coimbra.

Nos dias a seguir foi constantemente assaltado para lhes dizer como acontecera aquilo?... que “lança em África” fora aquela?... como era ele assim “à solta”?... que ingredientes lhe ministrara para assim o “virar do avesso”?... se teria acontecido por ser preto?... se filho de pai rico e poderoso?... se era boa a comida em casa dele ou uma desgraça de forreta incorrigível?… que vinhos tinham bebido?... se o ditador também ditava a vontade dele aos vinhos das miseráveis courelas que ia comprando à volta de casa, como um sôfrego avarento?... passavam eles, os vinhos, de suportáveis zurrapas?... se a D. Maria também almoçara com eles?... se ela e “o António” tinham esboçado ou deixado escapar algum gesto de ternura ou de intimidade?... se… se… se… enfim.

Aquelas línguas soltas não chegavam a irritá-lo, muito menos a surpreendê-lo, porque Carvalho da Silva desde cedo fizera o seu diagnóstico dos filhos dalgumas supostas elites sociais portuguesas e nunca mais procurara corrigi-lo, porque acreditava cegamente nas suas primeiras impressões.

Exactamente como gostava de enfrentar as primeiras impressões dos outros.

Os portugas finalmente acordam!

Essa era uma das mais recentes que descobrira, disfarçada de primeira impressão de tantos que naturalmente se acham no direito de julgar-nos.

O que queriam dizer era simples e até dava ideia de ser verdade.

Todos os europeus tinham abandonado as suas colónias em África sem a mínima resistência, fazendo a vontade aos negros de irem embora e abandonando tudo, menos os cordelinhos da vida económica e da arte de continuar a enriquecer explorando os recursos dos países abandonados, com a justificação moral de os terem criado.

Salvo os portugueses, tão displicentes os governos e cidadãos portugueses pareciam quanto a isso.

Mesmo as empresas que os portugueses haviam criado e, muitas vezes, grandemente desenvolvido, mesmo nessas, ou na maioria dessas, o espírito de abandono cego era quase igual.

Era por esse ângulo que Carvalho da Silva queria ver e justificar a chegada da Universidade privada dos portugueses a Luanda.

Como que era uma espécie de renúncia deles à fuga sem necessidade e um regresso às realidades e exigências de África.

Como uma reconquista!

Uma reconquista sem armas e pela força da inteligência e da simples capacidade de organização, enriquecendo os brancos e enriquecendo os negros seus colaboradores e apoios, com benefícios iguais para todos, portanto.

Carvalho da Silva pensava que a URSS já não tinha força nem alma para contrariar isso que lhe surgia, a ele, como apenas mais uma manifestação irresistível dos novos sentimentos da História.

Sem a força de apoio decidido da URSS, os comunistas locais estavam condenados a ter de mudar também.

Seria talvez fácil explorar-lhes a mudança ou, se não, dar um sentido à sua mudança, que sozinhos talvez não encontrassem…

Porque Carvalho da Silva pensava que, arrumadas nas gavetas da História as aspirações dos comunistas a salvadores da humanidade… Alguma coisa havia neles, talvez, que merecia ser salva, capaz de dar até uma espécie de justificação, tardia embora, a uma trajectória cheia de crimes mas também das esperanças de uma boa parte dos homens e mulheres deste mundo.

Para que não se perdesse tudo de tantas esperanças loucas e de tantos sacrifícios, tão inegáveis como incontáveis?

Não pôde deixar de sorrir, chegado aqui, como tantas vezes já.

Lembrava-lhe o comentário que o doutor Salazar fez, medindo as palavras para não o magoar, acreditava.

“Não pense que os comunistas… A verdade é que só nós, sobretudo como católicos, somos capazes desses balanços do positivo e do negativo da História. Para eles é tudo a preto e branco. Só entendem vitórias a cem por cento, suas ou dos outros, com as correspondentes derrotas a cem por cento também, dos outros ou suas.”

Mas ele próprio, Jucelino, não analisara nem concebera todas as potencialidades da situação, para poder ter então respondido ao Doutor Salazar, nos termos em que agora o faria e ele com certeza compreenderia e aplaudiria.

Não teve dúvidas até de que, por esses caminhos, se reabriam perspectivas de concretização segura dos sonhos maiores do estadista.

O comunismo já não era um obstáculo; havia que transformá-lo, e à sua já evidente derrota, numa ajuda inestimável…

Claro como a água mais límpida.

A.C.R.

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