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2007/11/20

Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte VIII – N.º 03 – A COMUNIDADE POLÍTICA INESPERADA 

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Rufino pressentiu desde logo que só Celestino Maria estaria à altura de executar consigo o formidável projecto africano que estava a germinar-lhes nas cabeças e excitar-lhes as mais loucas e enternecidas ambições.

Era preciso que tudo se apresentasse sempre assim, para o exterior, tão excessivo que ninguém acreditasse no projecto ou levasse minimamente a sério os seus supostos autores e agentes.

O único companheiro lúcido e louco bastante para consigo levar, sem dúvida até ao fim, tão desvairado plano era evidentemente Celestino Maria.

O génio!

O génio de todas as audácias e de todas as deslealdades, disfarçadas exactamente de qualidades contrárias às falhas estruturais maiores da sua natureza, por força da ambição sem limites nem escape que lhe alimentavam as forças e determinavam o estilo.

Tal como a imaginação de ambos.

E o sentido das oportunidades, nos dois também, estaria à altura das ambições e das ocasiões que o destino aparentemente lhes oferecia?

E as faltas de critério mais ajustado à acção, que Celestino já mais de uma vez revelara?...

Uma coisa são ocasiões, outra são oportunidades…

Esta, a presente oportunidade, mais do que aproveitada tinha de ser construída…

Sem que, por isso, a UL tivesse de pagar o que quer que fosse às esquerdas dominantes dos Estados lusófonos que para o efeito interessassem…

Já decidira que seria assim e explicou porquê a Celestino Maria, que concordou alegremente, até porque Rufino lhe prometeu que aquilo que a UL poupasse, dum lado, teria de ir, doutro lado, para os bolsos dos que arriscassem presente e futuro pessoais onde mais ninguém arriscava, eles próprios, portanto, mas também uma mão-cheia de outros, no Continente, nas Ilhas e no Ultramar.

Uma mão-cheia ou duas, talvez três ou quatro, sublinhou Rufino, entre brancos, pretos ou mulatos, mesmo “canecos”, desde que classificados como peças fundamentais ou decisivas da múltipla do xadrez novo que dali em diante iria jogar-se no tabuleiro colossal de dois ou três continentes.

Classificados de peças fundamentais ou decisivas por quem?

Pois por quem havia de ser?

Por um júri constituído pelos dois mais criativos, decididos e competentes jogadores desse xadrez e mais conhecedores das regras e objectivos desse xadrez divinal, de que apenas os dois manobrariam naturalmente não só os peões do jogo, mas todas as demais peças, sobre o tabuleiro inter-continental, em verdade predisposto pela História para os feitos das sucessivas gerações dos portugueses de mais fibra.

Ficou assente que Celestino Maria faria as necessárias abordagens numa primeira viagem a Luanda, Benguela e Lobito, tendo sobretudo em vista suscitar empatias favoráveis ao projecto. Sem esquecer, claro, que a Universidade criada pelos portugueses nos anos sessenta, com a fuga, depois da descolonização, dos professores idos de Portugal, entrara no caos e logo a seguir numa massificação em nexo que praticamente a paralisara.

Não constituía a Universidade pública de Angola, por isso, concorrente significativa para o pólo da UL a instalar, mas deixara uma triste fama e um desprestígio de que a UL dificilmente se livraria, sem grande decisão e audácia, discreta mas sem limites.

Celestino Maria telefonou de Luanda a Rufino verdadeiramente desanimado com o panorama de desconfiança generalizada, em Angola, contra o ensino universitário dos últimos anos!

“Mas isso pode ser formidável!” – exclamou da outra ponta da linha o indestrutível Rufino.

“É talvez o caso de dizermos que, quanto pior, melhor pode vir a ser… Pensa bem. Se encontrasses aí uma Universidade cheia de prestígio, e de alunos satisfeitos... Isso é que seria uma concorrente perigosa, talvez invencível e insuperável. Não haveria lugar para a UL. Assim, todo o campo é nosso. Tudo o que fizermos será infinitamente melhor que tudo que existe ou venha a existir aí nos próximos tempos. Só nos falta quem possa ajudar-nos a ocupar rapidamente o terreno e bem!”

“Olha! – acrescentou – Mando-te o nome, currículo e contactos para alguém que já me recomendaram como pessoa ideal com quem podes aconselhar-te. É de toda a confiança. Guarda segredo, por enquanto. Mas procura-o antes de formulares juízos definitivos. Garantem-me que está ansioso por ser-nos útil. Não te esqueças de agir com toda a discrição! Cuidado com as várias “secretas”. Sei que estão por toda a parte, mas os agentes delas podem ser neutralizados por aquela forma de que muito falamos aqui… Não poupes! Mostra todo o nosso poder e a grandeza das nossas intenções! Bem. Adeusinho!... E dá notícias frequentes! Não poupes nas chamadas! Quero notícias todos os dias. Também sabes como evitar as escutas. Aplica as regras sem receio, nem perdas de tempo. Adeusinho!... Ah! Ainda outra coisa. Não esqueças que do Governo não precisamos senão que nos deixe funcionar legalmente. Mostra-lhe as leis de cá para se inspirarem. E que nos assegurem uma base suficiente de alunos, bolseiros com propinas pagas pelo Estado… Agora é que é mesmo. Adeusinho! Queres que diga alguma coisa à Cecília?... Não?... Ora adeusinho, então!”

E desligou finalmente.

A.C.R.

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