<$BlogRSDUrl$>

2007/11/21

Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte VIII – N.º 04 – OS QUE NÃO SE VENDEM 

(<--)

O homem afigurou-se, com efeito, a Rufino, imediatamente após conhecê-lo e durante a longa conversa do primeiro encontro de ambos, como um extraordinário achado, uma revelação de primeiríssima água, se a conversa não iludia.

Como era possível!

Como era possível, num ambiente tão acanhado como ao fim de três semanas de múltiplos contactos, nos meios governamentais, políticos em geral e empresariais, tudo lhe parecia ser ?... Como era possível numa Angola abandonada pelos portugueses, dando-lhe a ele a sensação de o território mal saber que fazer à independência?...

Os angolanos conscientes disso parecia não encontrarem melhor tábua de salvação para Angola que as esquerdas, o que em geral descambava totalmente em confiança cega, entusiástica nos comunistas!

Quer dizer que, quando Carvalho da Silva, como confessou no primeiro encontro a Celestino Maria, já pouco esperava do comunismo internacional, soviético ou não, para os mais altos expoentes políticos que conhecera, isso ainda era e representava o futuro e a salvação de Angola…

Pior ainda que a cegueira das esquerdas portuguesas do PREC!

Que horrendo atraso mental e cultural lá tínhamos deixado! Como fora possível, não obstante uma Universidade que tanto dinheiro e sacrifícios nos custara? – perguntava-se Rufino, sem querer nem poder acreditar.

Na verdade, conversando longamente, por duas ou três vezes, com Carvalho da Silva, acabou ele por perceber que bastava o caso deste para compreender que os seus anteriores juízos, a tal respeito, eram completamente infundados ou, pelo menos, que tinham de ser corrigidos pelo formidável exemplo do próprio Carvalho da Silva.

Seria uma única e solitária excepção?

Com grande surpresa, Celestino Maria foi rapidamente verificando que, se as análises sócio-políticas de Carvalho da Silva não eram correntes ainda, pelo menos o estado de espírito que traduziam estava singularmente difundido.

Digamos que o comunismo mítico das elites angolanas mais visíveis, e ainda as mais influentes, não passava duma sobrevivência. Uma sobrevivência, de facto, como que saudosista ou reflexa apenas, dos lugares-comuns ideológicos que dez. vinte e trinta anos antes tinham alimentado o levantamento duma certa elite social negra, contra certo domínio português.

Em vez disso, ia concluindo Celestino Maria, a partir das conversas com Carvalho da Silva e os meios sociais que ele lhe abriu, o que estava a alastrar era o estado de espírito de ruptura dos novos comunistas, se tal lhes podemos chamar, com o comunismo dos “fundadores” do levantamento independentista dos anos cinquenta-sessenta.

Isso vinha ao encontro da análise de Rufino, a respeito do futuro do comunismo soviético internacionalista e mundialista.

“Os portugas finalmente acordam!” – diziam entre si alguns dos mais conscientes angolanos em Luanda e um ou outro, sintonizados com estes, no Lobito e em Benguela.

Carvalho da Silva trabalhava no ministério angolano dos Negócios Estrangeiros, em Luanda, na sede do Governo. Pareceu a Celestino Maria que em funções mal definidas ou de âmbito muito geral e vago. Uma espécie de pau para toda a obra, o que podia significar grande confiança nele, da parte dos chefes, como nenhuma confiança em particular. Pode dizer-se que não incomodava ninguém e que ninguém o incomodava a ele.

Talvez por ser filho de um soba local do interior nordestino, muito rico, dizia-se em Luanda, que fizera questão de o mandar estudar medicina em Coimbra e que exercia grande poder na sua área de influência, sobretudo pela confiança que merecia ao governo em Luanda.

Quando Celestino Maria o conheceu, o filho do soba “dos diamantes”, isto é, da zona dos diamantes de Angola, continuava a mostrar grande orgulho por ter sido recebido uma vez pelo “Presidente Salazar”.

“E na sua própria casa, no Vimieiro, pertinho de Santa Comba Dão, veja lá!” – adiantou ele ainda a Celestino, com manifesta vaidade.

“E como o povo me recebeu à porta da casa do “Presidente”, quando apareci no meu Maserati descapotável! Entrei por entre alas de pessoas que rodeavam o carro de boca aberta! A sério!...

“Valia mais, então, ser recebido uma só vez pelo “Presidente Salazar” do que ser recebido agora dez vezes, em Belém, pelo Mário Soares…” – não se coibia ele de dizer, deixando perfeitamente embaçado Celestino, que receava contradizê-lo.

Mas Carvalho da Silva tomou por anuência o silêncio e por simpatia o ligeiro sorriso de Celestino. Tanto que daí em diante não parou de inchar a sua confiança no português ido “propositadamente” de Lisboa, para se entender com ele sobre assuntos tão transcendentes como era o da nova comunidade em vista de todos os grandes Povos de Língua Portuguesa, crescendo com o ensino universitário privado, que iria uni-los a todos num só e definitivo abraço, muito apertado e inter-continental.

A.C.R.

(-->)

Etiquetas: , , , ,


This page is powered by Blogger. Isn't yours?

  • Página inicial





  • Google
    Web Aliança Nacional