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2007/08/03

Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte VI – N.º 24 – OS JOVENS TIGRES 

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Só um pequeno grupo de jovens professores veio protestar, alegando contra o uso das vestes académicas.

Eram encabeçados por um arregimentador de movimentações que Rufino já conhecia, recém licenciado na Universidade pública com alta classificação, o qual, não obstante os convites repetidos da sua própria Universidade, resolvera apostar na Universidade privada, onde calculava vir a obter, e de facto o aguardavam, promoções muito mais rápidas.

Dizia ele, em nome dos colegas, que era “uma indecência” os professores graduados na Pública poderem usar vestes próprias, quando os professores como eles não podiam usá-las, por as não terem, nem poderem arranjá-las de um momento para o outro, apesar dos Conselhos dos Departamentos lhes haverem atribuído categorias académicas com direito às mesmas vestes.

Rufino percebeu imediatamente aquilo que os movia.

Vaidade apenas e ciúme, além do atrevimento que não estava disposto a tolerar.

Mas ciúme sobretudo, por os travestidos poderem vir a ser tidos pelos alunos e famílias, só por isso, como melhores professores, nas suas farpelas medievais.

“Não tenham pressa! – disse-lhes Rufino –. Vocês têm todo o tempo à vossa frente. Contamos totalmente convosco para fazermos a melhor Universidade do País!”

A malta foi-se embora, mas sem saber se havia de deixar-se convencer. Em todo o caso, acalentada por tão grandes expectativas e desafios que o “fundador” da Universidade não hesitava em oferecer-lhes!

Era dali que se gerava o futuro!

Ficaram a conhecer-se bem, um ao outro, desde então, o jovem líder dos professores jovens e Rufino, o administrador-delegado e autoridade maior da entidade patronal de Libânio Ferreira, esse jovem líder dos “jovens lobos”. Assim eram conhecidos, entre os mais velhos e já “instalados”, na rotina das grandes Universidades, estes aspirantes a “futuros donos da U.L.”. Uma aspiração que não contestavam nem deixavam de contestar, porque a intriga era para eles diversão e vício de mulheres e eles não queriam as mulheres senão para casar.

Mas, como colegas, apenas umas marronas, vistosas às vezes mas de conversas pouco convidativas e mesmo nada interessantes… “Culturalmente”, claro, pois que, para o efeito, nada as ajudava maquilharem-se ou pôr as pernas ao léu, quando se sentavam, mesmo que nisso desperdiçassem árduos esforços a tentar cobrir pudicamente os joelhos, para melhor revelarem como seriam bonitos, saudáveis e apetitosos, além de… estudiosos.

Na verdade, as professoras na Universidade eram por essa altura muito menos que passados trinta anos, mal começavam a ousar aparecerem., “imiscuir-se”, como aqueles jovens colegas diziam delas, sem piedade e até frente-a-frente, como eles gostavam especialmente que elas lhes dessem oportunidades.

O professor Libânio Ferreira e a noiva – casariam daí a meses – tiveram de confessar que a festa inaugural da UL, em Lisboa, foi com efeito um grande sucesso.

Ostensivamente, ambos exibiram a sua satisfação em todos os cantos e recantos da Universidade, de modo a convencer toda a gente de que, não só haviam participado entusiasticamente na festa, como era um facto dever-se-lhes pessoalmente grande parte da mobilização geral para o êxito dela.

Não era nenhuma mentira!

Com grande surpresa, todos os viram chegar, antes da festa começar, a ele e a ela, acompanhados pelos restantes do grupo de jovens professores protestantes de uma semana antes… Mas tudo “fardado” universitariamente a rigor, pessoal!

Rufino tivera zunzuns da intenção deles e, mal o soube, apressara-se a convocar o líder para o pôr à vontade, no caso de “o grupo” precisar dalgum empréstimo para a compra das vestes adequadas ao “estatuto” de cada professor.

Libânio Ferreira apressou-se a dizer que sim e de quanto precisavam, como se tivesse acabado de pensar demoradamente no assunto.

Ofereceu-se mesmo para ficar garante da pronta e integral restituição do valor “adiantado” pela UL. E Rufino teve de concordar, tal foi a insistência do chefe dos “jovens lobos”, que aproveitou para insinuar que gostaria mais de vê-los titulados de “jovens tigres”, a partir de então.

Assim viriam de facto a aparecer designados no larguíssimo noticiário da TV, Rádio e Jornais sobre a festa, durante dois ou três dias.

Assim também ficariam conhecidos e louvados, a partir daquela hora, sem desprimor mas com bastante menos projecção, para o Professor e para Rufino.

Mas Rufino explorava a seu modo essa publicidade a favor da UL, que se tornou, de facto, na única grande vedeta do acontecimento, por muito que outros se pusessem em bicos de pés.

Mas Libânio não deixou de insistir com Rufino noutra coisa.

No dia seguinte, Libânio visitou sozinho o administrador-delegado para ter o privilégio de ouvir-lhe em directo os juízos mais secretos e, se possível, alguma confidência. Mas também como que para fazer-lhe as suas propostas. É que passara, desde o triunfo “em comum”, a ter-se por aliado privilegiado de Rufino, convicto, talvez antes de outros quaisquer, de quanto Rufino viria em breve a carecer de bons, fiéis e fortes aliados.

“Por exemplo, Professor Rufino – V. Exa. deveria contratar no futuro, como Professores da nossa Universidade, só docentes titulares, naturalmente possuidores das farpelas adequadas…”

Rufino olhou Libânio com disfarçada surpresa mas logo percebeu, antes de abrir-lhe a porta do corredor, com um largo sorriso e um ligeiro amigável encontrão de ombros.

Libânio não queria, ali dentro, mais concorrentes da sua geração!

A.C.R.

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