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2007/04/11

Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte IV – N.º 20 

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A longa marcha, consolidada, de Boma-Matadi a Kinshasa, incluindo a construção do caminho-de-ferro chamado do Baixo Congo, levou alguns anos, cerca de doze bem contados e muito sofridos e estirados.

Mas representou, em si mesma, talvez o maior e mais rápido sucesso da ocupação/colonização europeia na África ao Sul do Saara, em todo o caso só possível pela apertada colaboração da pluri-secular colonização portuguesa das margens do Zaire, na sua foz, e com o reino do Congo controlado pelos portugueses e nossos missionários, quase desde a primeira viagem até ali, de Diogo Cão e, sobretudo, após a instalação e expansão do comércio de escravos, a partir do séc. XVI.

Os colonos portugueses dessa epopeia – chame-se-lhe assim, creio que com toda a justiça – não se demoravam a pensar nisso, mas não resistiam quase nunca, entre si, a ver-se como os heróis de qualquer coisa absolutamente impensável em termos exclusivos de Europa e de Portugal.

Curioso que, se assim foi, nunca senti esse sentimento de auto-glorificação transmitido de pais para filhos e muito menos ainda para netos, bisnetos ou trinetos.

Era tudo coisa para se viver entre os colonos, o mais possível em família e muitas vezes nem isso.

Mas os primeiros, os que partiram do Ambriz e de Boma, Lândana ou Matadi e levaram até ao fim o seu zelo e a sua obra, esses constituíram uma elite não propriamente ciosa de pergaminhos mas que os outros instalaram para sempre num pedestal donde nunca foi apeada e cuja memória foi engrandecida e respeitada, durante décadas, até à descolonização e para além dela, em muitos casos, na Bélgica, nas Beiras e no próprio Congo. Não só entre os colonos brancos subsistentes e continuadores dos antigos, mas também entre a nova classe de comerciantes posterior à descolonização, toda de negros do Congo, muitas vezes filhos e netos dos negros que haviam sido empregados das casas comerciais dos brancos.

Comercialmente, umas centenas de brancos, poucos milhares, portugueses, belgas, gregos, principalmente, fizeram, em vinte-trinta anos, dos primeiros trezentos a quatrocentos quilómetros do curso do Congo, até Kinshasa e mais para cima, nas terras que viriam a constituir o núcleo fulcral fundador do Estado Livre do Congo, um modelo de expansão colonial rápida, pacífica e profunda, explosiva em intensidade, penetração e rapidez.

Todos juntos, a partir dos impulsos dados pelos portugueses, eles, portugueses, os belgas e os gregos e até espanhóis, holandeses, saxões, ingleses, todos juntos, fizeram daquelas terras do Zaire um modelo de progresso colonial exemplar mas seguramente inimitável, porque faltariam sempre os factores humanos que deram o impulso e o ponto de partida que explicam tudo.

Num ápice de pouquíssimos anos, com a iniciativa desenfreada mas altamente controlada, prudente apesar de tudo e muito bem orientada pelo instinto da grande maioria para os negócios mais diversos, instalaram-se nessa zona do Congo muitos dos negócios mais arrojados e melhor adaptados às condições locais que podiam encontrar-se em qualquer parte do mundo e da África toda.

Em matéria industrial começou-se, pode ser dito, por uma indústria de topo, a construção e reparação naval, logo seguida da construção e reparação de carruagens para caminho de ferro, ao mesmo tempo que proliferavam as fábricas e fabriquetas de óleo de palma e se desenvolvia a actividade pesqueira no rio Congo, desde a foz aos mais remotos afluentes da zona equatorial.

Com o desenvolvimento das explorações agrícolas e agro-pecuárias, rapidamente as produções se tornaram excedentárias, cedo tendo começado a aparecer na Europa, embarcados em Boma e Matadi, os produtos africanos mais apreciados, como a banana, o dendém, a ginguba, o cacau, o coconote, o arroz, o tabaco, a mandioca e até o índigo.

Muitas casas comerciais do Congo tinham em Bruxelas os seus agentes comerciais encarregados da propaganda e vendas dos artigos coloniais.

Fora das sanzalas, que na verdade durante muitos anos pouco mudaram, nasceram e desenvolveram-se por toda a parte, ao longo da linha férrea, as povoações de brancos que exigiram, sempre em crescendo, uma indústria de construção civil que pouco a pouco foi refinando, sobretudo a partir do momento em que os extractos mais variados da população branca se tornavam mais exigentes em matéria de habitação própria, como os comerciantes enriquecidos, os quadros da ocupação militar e os funcionários da administração pública belga, rapidamente tornada tentacular.

Mas não só.

Também os próprios negros que, empregados nas fazendas e nas explorações comerciais e industriais mais diversas, passaram a constituir gradualmente um extracto de consumidores pouco a pouco mais exigentes e com poder de compra crescentemente significativo.

O governo colonial belga desde sempre o compreendeu e, não só por isso, sempre se opôs à utilização de mão-de-obra escravizada, tendo combatido radicalmente as tentativas, poucas, que houve aqui e ali de a ressuscitar.

A.C.R.

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