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2007/04/13

Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte V – N.º 01 

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Não admira por tudo isto que fosse muito frequente o “capitão” Gomes discutir com o seu banqueiro de Boma, Matadi e, já agora, Kinshasa a melhor aplicação dos fundos líquidos de que crescentemente dispunha, em resultado dos seus largos investimentos em sociedades diversas. Que naturalmente incluíam a do próprio banco, a do caminho-de-ferro do Baixo Congo, as que exploravam os portos referidos, as sociedades para a exploração de fazendas agrícolas e agropecuárias e a das transferências para a Indochina. Sem falar doutro negócio de que muito à boca pequena começava a constar, mas com grande insistência, o negócio das armas para os sobas negros, sempre em revolta potencial contra a “ocupação europeia”, fosse no Congo Belga ou no Congo Francês, como mesmo em Angola.

Certa ocasião, aí por 1905, o seu amigo e banqueiro Espírito Santo falou-lhe duma grande empresa “das Beiras” que necessitava dum substancial empréstimo para investimentos seguros e oferecia garantias sólidas.

Não lhe soube o banqueiro dizer mais nada a não ser que seria qualquer coisa relacionada com a Casa do Arco, em Viseu, o bastante para que Zé Gomes, agora já várias vezes comendador em Portugal, em França e na Bélgica, ficasse de orelhas espetadas para o caso.

Mas o “capitão” pensou que, em negócio de tanta monta, só em si próprio podia confiar, nem mesmo no banqueiro comprovadamente amigo, e de repente decidiu-se a ir pessoalmente a Portugal, aonde não voltara jamais, pensando que seria uma ocasião de conhecer um terreno para negócios por que nunca verdadeiramente se interessara ainda.

Até porque se habituara a considerar o País, a avaliar pelas notícias dos jornais, politicamente muito instável e pouco seguro para negócios sérios, como se orgulhava de sempre serem e terem sido os seus até aí.

Habituado à segurança do seu “faro” para os negócios todos, Zé Gomes nem por instantes duvidou de que valia a pena “ir ver” nos próprios sítios.

E sem demoras, veio por aí Atlântico fora.

Quando chegou a Viseu, teve a mais completa surpresa de ser informado que o assunto podia efectivamente ser tratado ali mas que o negócio principal era com… a Casa das Obras, em Seia.

Em todo o caso, acrescentou o informador, até lhe parecia que o negócio já estava fechado caso se tivessem confirmado, como constava, as expectativas de que lhe falara o administrador da Casa das Obras, uma semana antes.

Como lesse uma profunda decepção nos gestos e reacções faciais do “capitão” e comendador – para muitos já conhecido pelo “comendador capitão” e para alguns como “capitão comendador”, Zé Gomes deixara de ser para todos – o seu informador apressou-se a sossegá-lo, pedindo-lhe que esperasse um pouco, porque talvez a “Senhora Condessa” tivesse informações seguras e actualizadas.

Com efeito tinha e era no sentido de que os “fidalgos” de Seia haviam já recebido várias propostas, entre as quais ainda não haviam escolhido nenhuma, por serem todas más ou de pouca confiança.

Que fosse de pressa a Seia, onde sabia que os “fidalgos” haviam pernoitado – disse-lhe a Condessa dos Arcos – porque os apanharia com certeza a tempo de ter deles as informações de que carecesse.

A Condessa era um encanto de Senhora e o “capitão comendador” saiu dali com as melhores disposições para o negócio.

Antes, porém, de dirigir-se a Seia, o “comendador capitão” procurou em Viseu o melhor advogado que lhe indicaram, porque queria abordar os “fidalgos” respaldado nas melhores informações possíveis sobre as precauções que tinha de tomar, não fosse o Direito em Portugal muito diverso do que vigorava no Congo.

O advogado começou por informá-lo de que tinha ido parar à melhor porta para esclarecer-se, pois que “Suas Senhorias”, os “fidalgos”, eram seus clientes e o haviam encarregado exactamente de dar informações sobre o negócio aos eventuais pretendentes, desde que idóneos, o que – logo adiantou – se lhe afigurava ser o caso de “Vossa Excelência, Senhor Comendador”.

E explicou porquê.

“É que não há seguramente em Portugal inteiro, um homem tão novo como Vossa Excelência, com fortuna bastante, e evidente liquidez, para se abalançar a negócio de tantíssima monta! O maior jamais feito nas Beiras!”.

“E garantias?...” – perguntou o antigo Zé Gomes, com algum pudor, por falta ainda de hábito específico para isto, e quase a medo.

“As habituais” – retorquiu o advogado.

“Bem – completou este depois duma pausa breve –. Mas isso tratará Vossa Excelência directamente com os fidalgos.”

Tanto bastaria para dali sair o comendador muito animado, direito a Seia. Mas aconteceu ainda que, fortemente instado e muito em segredo, o advogado acabou por confessar-lhe saber que os fidalgos estariam dispostos a dar como garantia do empréstimo o próprio edifício da Casa das Obras, se o juro e o prazo de pagamento do empréstimo fossem os adequados e convenientes.

A.C.R.

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