2007/10/02
Memórias das minhas Aldeias
Esquecimentos da História
Parte VII - N.º 06 - UMA GRANDE ESCOLA
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O pároco novo do Salvador e o Bispo viriam a ser os seus grandes mestres de ciências sociais e de política, como o próprio Rufino gostava de proclamar a quem se dispusesse para ouvi-lo.
A “faísca” entre ele e o pároco chispou logo à primeira apresentação, com o que Rufino não deixava de sentir ema espécie de remorso, tanta a facilidade e rapidez com que a atracção pelo pároco novo substituiu no seu íntimo a simpatia, a amizade e a viva dedicação que votara sem reservas ao Pe. Manuel, durante anos tão seu amigo e inspirador, além de director de consciência sempre ansiosamente escutado, tantas vezes com verdadeira devoção.
Mas foi já o novo pároco e, quase sempre através dele, o Bispo da diocese, que o guiariam e inspirariam nas primeiras “guerras” que o destino ia tecer-lhe e ele travaria com gosto, apaixonadamente descobrindo sucessivos mundos, com os olhos muito abertos da sua adolescência espantada, surpreendida, inquieta e sequiosa de novos saberes e de encontrar os rumos certos.
Pequenas guerras, guerras “locais”, por assim dizer, que não passariam de meras escaramuças, quando cotejadas com as futuras guerras da sua idade madura.
No fim de contas, tratou-se quase exclusivamente de guerras consigo próprio, que a sua consciência pôde vencer, salvo muito poucas excepções, limada e afinada como se julgava pelas conversas e discussões travadas com o novo pároco e pelas mensagens que, através dele, lhe mandava o Bispo. Encontravam-se aliás, sem falta, todas as vezes que, mais ou menos solenemente, o Bispo visitava alguma paróquia daquelas redondezas. Muito do precoce prestígio de Rufino naquelas aldeias vinha dessa familiaridade com o Bispo. Até Rufino ter batido em retirada para longe da aldeia e das inquietações que lhe trouxe o desenlace dos seus amores licenciosos com Isabel.
A mais dramática de todas as situações foi quando Rufino se sentiu obrigado a contar ao pároco novo tudo quanto se passara e o pároco nem queria acreditar, como que meio fulminado por tantas coisas acontecidas sem ele se aperceber minimamente, nem vez alguma lhe terem chegado aos ouvidos fosse como fosse.
- Então – balbuciou o pobre padre, já resignado ao papel frequente de mero contabilista do pecado – quantas vezes comungaste em pecado mortal?
Rufino não foi capaz de pronunciar uma palavra só e desatou a chorar, tentando agarrar-se ao Padre José, na esperança do conforto dele.
Em vez de o atrair, para chorarem juntos, como Rufino talvez ansiasse, o Padre não resistiu a enfiar-lhe dois tremendos sopapos nos queixos que o atiraram para o chão.
Remédio santo!
Instantes depois, Rufino voltou a si, sem vontade nenhuma de confessar mais nada e, recuperado o controlo de todas as suas fibras, levantou-se serenamente, para desabafar…
- Meu Padre, receba o que lhe contei como a confissão dum grande pecador arrependido. Tomo a tareia recebida como a mais dura penitência que já apanhei. Considero-me perdoado. Não me julgo capaz de não voltar a pecar. Mas estou pronto a prometer que farei todos os esforços, juro…
Não foi preciso acto mais formal de contrição.
Então o Padre abençoou-o com toda a solenidade, como se estivessem no confessionário, e Rufino mal o ouviu dizer-lhe:
- Vai e não peques mais!
Rufino não olhou para trás.
E não voltaram a ver-se, a não ser perto de três anos depois, quando pela primeira vez Rufino voltou a Portugal numas pequenas férias, vindo do seu trabalho em França.
A.C.R.
A “faísca” entre ele e o pároco chispou logo à primeira apresentação, com o que Rufino não deixava de sentir ema espécie de remorso, tanta a facilidade e rapidez com que a atracção pelo pároco novo substituiu no seu íntimo a simpatia, a amizade e a viva dedicação que votara sem reservas ao Pe. Manuel, durante anos tão seu amigo e inspirador, além de director de consciência sempre ansiosamente escutado, tantas vezes com verdadeira devoção.
Mas foi já o novo pároco e, quase sempre através dele, o Bispo da diocese, que o guiariam e inspirariam nas primeiras “guerras” que o destino ia tecer-lhe e ele travaria com gosto, apaixonadamente descobrindo sucessivos mundos, com os olhos muito abertos da sua adolescência espantada, surpreendida, inquieta e sequiosa de novos saberes e de encontrar os rumos certos.
Pequenas guerras, guerras “locais”, por assim dizer, que não passariam de meras escaramuças, quando cotejadas com as futuras guerras da sua idade madura.
No fim de contas, tratou-se quase exclusivamente de guerras consigo próprio, que a sua consciência pôde vencer, salvo muito poucas excepções, limada e afinada como se julgava pelas conversas e discussões travadas com o novo pároco e pelas mensagens que, através dele, lhe mandava o Bispo. Encontravam-se aliás, sem falta, todas as vezes que, mais ou menos solenemente, o Bispo visitava alguma paróquia daquelas redondezas. Muito do precoce prestígio de Rufino naquelas aldeias vinha dessa familiaridade com o Bispo. Até Rufino ter batido em retirada para longe da aldeia e das inquietações que lhe trouxe o desenlace dos seus amores licenciosos com Isabel.
A mais dramática de todas as situações foi quando Rufino se sentiu obrigado a contar ao pároco novo tudo quanto se passara e o pároco nem queria acreditar, como que meio fulminado por tantas coisas acontecidas sem ele se aperceber minimamente, nem vez alguma lhe terem chegado aos ouvidos fosse como fosse.
- Então – balbuciou o pobre padre, já resignado ao papel frequente de mero contabilista do pecado – quantas vezes comungaste em pecado mortal?
Rufino não foi capaz de pronunciar uma palavra só e desatou a chorar, tentando agarrar-se ao Padre José, na esperança do conforto dele.
Em vez de o atrair, para chorarem juntos, como Rufino talvez ansiasse, o Padre não resistiu a enfiar-lhe dois tremendos sopapos nos queixos que o atiraram para o chão.
Remédio santo!
Instantes depois, Rufino voltou a si, sem vontade nenhuma de confessar mais nada e, recuperado o controlo de todas as suas fibras, levantou-se serenamente, para desabafar…
- Meu Padre, receba o que lhe contei como a confissão dum grande pecador arrependido. Tomo a tareia recebida como a mais dura penitência que já apanhei. Considero-me perdoado. Não me julgo capaz de não voltar a pecar. Mas estou pronto a prometer que farei todos os esforços, juro…
Não foi preciso acto mais formal de contrição.
Então o Padre abençoou-o com toda a solenidade, como se estivessem no confessionário, e Rufino mal o ouviu dizer-lhe:
- Vai e não peques mais!
Rufino não olhou para trás.
E não voltaram a ver-se, a não ser perto de três anos depois, quando pela primeira vez Rufino voltou a Portugal numas pequenas férias, vindo do seu trabalho em França.
A.C.R.
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