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2004/04/21

O declínio da Europa e a ideologia onusiana (VI) 

(continuação do post de 2004/04/20)

A crise que a Europa e, em geral, o ocidente atravessam actualmente – de que o terrorismo é um sinal preocupante e chamativo – tem as suas causas dentro de portas. E não fora delas. A crise da Europa é interna; é consigo mesma. A verdadeira ameaça está cá dentro. Não é de crer, por isso, que a solução se deva procurar em acções externas, fora do seu espaço, e muito menos militares.

A grande crise da Europa é a crise do chamado homem moderno e da sua falta de sentido. O homem moderno tanto barafusta porque quer auto-estradas, que considera essenciais para o desenvolvimento, como berra porque não quer que a auto-estrada lhe passe à porta; sujeita-se a tudo para ganhar uns tostões num concurso televisivo, mas acha que realizar certos trabalhos socialmente menos considerados é coisa humilhante e degradante; é apologista da igualdade, da tecnologia e do progresso, mas admite que estes possam ser utilizados para seleccionar vidas humanas.

A resolução da crise europeia passa pela desmontagem das concepções de fundo que criaram o “homem moderno”, que são as mesmas que sustentam a ideologia onusiana e que, em termos genéricos e de princípio, decorrem da Revolução Francesa, a saber:

1) a ingenuidade antropológica de Rousseau ou a teoria do bom selvagem: os homens nascem bons, em estado imaculado; a sociedade e as suas estruturas (família, a religião, as forças de segurança e da ordem, enfim, tudo quanto possa cheirar a hierarquia e autoridade) é que o fazem mau e depravado, pelo que se impõe o desmantelamento de tais estruturas a fim de que cada homem possa manifestar-se em “estado puro”.

2) que o povo é que governa, por via eleitoral; identifica-se a democracia com os votos e com o poder dos partidos, isto é, com a partidocracia, ainda que frequentemente os eleitores não conheçam de parte nenhuma a maior parte dos eleitos e votem sempre em candidatos escolhidos pelos partidos, muitas vezes com convicções contrárias às suas, sem o saberem, em matérias, como por exemplo, o aborto, a educação sexual, leis sobre educação e família, etc. Fica de fora a genuína ideia de democracia: a capacidade de cada um intervir na vida política e social pelas suas convicções e pelo seu querer. Eles não admitem que alguma coisa fique fora dos partidos e dos seus homens; para eles a vida política começa e acaba nos partidos, que representam necessariamente os cidadãos, mesmo quando se atingem taxas de abstenção de quase 40% e até, em algum caso, de 50%. Numa sociedade partidarizada os abstencionistas não contam para a vida política. Politicamente, são clandestinos.

3) que a liberdade individual é uma concessão do estado de direito democrático; ou seja, que os homens devem a sua liberdade ao Estado e aos que o representam. Não pode haver boutade mais cínica e arrogante, pela qual cada homem se tornaria devedor da sua própria liberdade e, por isso mesmo, sempre limitado e manietado para pôr em questão o sistema, seu credor, sempre em posição de lhe recordar que não pode morder a mão de quem lhe dá de comer.

4) a ideia do Estado democrático como fonte e origem do direito ou o chamado Estado de direito, como se ao longo da História os Estados e as Nações não se baseassem no direito e nas leis: em Roma, como no início da nacionalidade portuguesa. Que o povo democraticamente define os direitos e aprova as leis é outra sentença com piada, não soubéssemos nós como são os políticos parlamentares, tantas vezes à revelia do sentir popular, que aprovam e reprovam o que lhes dá na gana. Sempre que o povo se pôde pronunciar em referendum fê-lo contra a maioria parlamentar. E já agora, quem é que define os direitos humanos? Não me digam que também é o povo.

O truque é simples: os iluminados definem quais são os direitos (que eles dizem ser do homem) que os pobres mortais hão-de aceitar, quer queiram, quer não.

O sistema assente sobre estes pressupostos gerou, na Europa, ao longo de décadas, homens vacilantes, débeis de vontade, faltos de determinação, tolhidos pelo medo e por complexos de inferioridade e de culpa. Medo da guerra, medo de morrer, medo de ter filhos, medo de assumir compromissos, medo de Deus, medo da dor, medo da própria vida. Eis o homem fraco e degenerado da Europa de hoje: um homem de rastos diante de si próprio. Eis o homem da educação para a cidadania mundial.

A crise está cá dentro e, mais do que no regime político, reside na concepção de homem. É por isso que não se resolve com acções externas nem com soldados militares. O que a Europa de hoje precisa é de soldados políticos. O choque de civilizações existe, conforme diagnosticou Samuel Huntington. Mas a resposta apta não é militar, pelo menos numa fase inicial: é política e interna.

A Europa precisa de um pensamento pós-moderno, de concepções diferentes de homem, de sociedade e de mundo, que supere a crise em que se vê atolada pela Revolução Francesa e pela ideologia onusiana:

1) Assumir o realismo da condição humana; o reconhecimento dos limites e fraquezas, presentes em cada homem, sem excepção. Não mais utopias.

2) A superação das particularidades.
Assumir, reconhecer e respeitar as particularidades pessoais, que sempre existem. Assumir aquilo que pessoas e grupos têm em comum e com o qual todos se identificam ou tendem a identificar. Nesse sentido, a nota essencial do pensamento pós-moderno é que cada pessoa seja capaz, pelo seu querer, de superar a sua particularidade e se universalizar, sem estar à espera que o Estado de direito tome a dianteira ou tenha iniciativas. É esse o repto que o pensamento pós-moderno lança a cada homem.

3) O pensamento pós-moderno reconhece a primazia do interesse geral sobre o interesse particular, mas não aceita que tal primazia se afirme à custa do esmagamento arbitrário da pessoa pelo colectivo ou pelo aparelho de Estado, como pretende o socialismo.

4) A existência de um objectivo comum, de um destino, de uma ideia que potencie o que os elementos de uma comunidade têm em comum, configura o seu relacionamento, cria laços específicos entre as pessoas e os grupos em ordem à consecução de um bem maior que o estritamente individual ou de grupo. É a isso que leva a Nação: à criação de laços que sustentam uma comunidade nacional. É nessa relação que a Nação se manifesta como realidade exterior ao pensamento – metaimanente ou transcendente – mediante relações específicas e qualificadas entre os elementos da comunidade nacional.

No dia em que superarmos as aldrabices de 1789 e da ideologia onusiana e assumirmos um pensamento pós-moderno, aí começámos a ter uma nova Europa.

Manuel Brás

(continua num próximo post)

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