2008/03/10
CONTA-ME COMO FOI …(6)
BREVE ELUCIDÁRIO DOS INCÊNDIOS FLORESTAIS
Numa análise rápida, aparentemente inspirada e realista, embora efectivamente mais ou menos comum ao que toda a gente sabia e exaustivamente se observava e repetia, a situação da floresta seria a que segue, em Portugal, de Sul a Norte. Mas entrando pelos olhos adentro sobretudo no Centro, entre Douro e Tejo, e, em particular, na Beira Interior, entre Douro e Mondego, distritos da Guarda e Viseu, a que deve juntar-se o de Castelo Branco e boa parte do distrito de Santarém, como do distrito de Coimbra.
Era um País coberto de pinheiros bravos e eucaliptos, material bendito para incêndios, como todos sabiam, particularmente ajudado pela resina, que nada apagava, do p.n.b., o pinheiro nacional bravo, e pela estrutura lenhosa rápida e irresistivelmente consumível pelo fogo, dos altos troncos e largas copas dos eucaliptos, atreitos ao lume como papel fino e seco qual palha criada à torreira dos longos dias de sol em cheio.
Depois, era só esperar pelos verões quentes e secos, um tempo sem gota de água caída do céu de Março a Outubro, deixando os terrenos áridos e ressequidas as ervas que neles proliferavam mesmo assim.
Uma ponta de cigarro caída aqui, outra além, com a estupidez da inocência pateta e da incúria criminosa dos fumadores, priscas muitas vezes atiradas pelas janelas dos automóveis ocupados por citadino, ou outros que tais, que passavam sem nada saber nem perceber do fogo ou riscos de fogo que iam espalhando atrás de si; outras vezes, nos longos percursos de caminho de ferro das linhas do Norte, da Beira Alta ou da Beira Baixa, eram as fagulhas soltas pelas máquinas dos comboios que iam acendendo os fogos que depois nada já apagava, enquanto houvesse madeira, lenha e matos para arder; não poucas vezes também, seriam os incendiários interesseiros que deitavam o fogo intencionalmente às matas, para venderem ao desbarato a madeira ardida, ou simplesmente chamuscada, aos madeireiros aproveitadores das oportunidades de ouro oferecidas de mão-beijada; sem esquecer ainda as matas que ardiam para simplesmente em seu lugar se poder fazer urbanizações que antes disso não seriam permitidas pelos municípios; mas sem esquecer também os piqueniques e magustos que miúdos e graúdos, descuidados e falhos de lembrança ou esquecidos de mil advertências, teimavam em ir fazer para o meio do material combustível de qualquer mata ou matagal à beira das estradas e caminhos rústicos; caminhos e estradas que raramente impediam os fogos de se propagar, porque o lume, se não se espalhava pelo chão, espalhava-se pelo alto, das copas das árvores para as copas doutras árvores; copas e copas que muitas vezes se tocavam ou aproximavam entre si o bastante, vencendo as barreiras de estradas e caminhos, que assim apareciam, com frequência, mais como factores de propagação dos fogos do que como obstáculos à sua corrida desabalada e enlouquecedora através dos campos, ameaçando tudo, inclusive povoações e casas habitadas, em geral salvas in extremis pela arte dos grandes especialistas e heróis também da guerra contra os fogos ou pela sua prevenção, os sempre martirizados bombeiros e corporações de bombeiros, mesmo quando pouco preparados e até mal ou desaquadamente apetrechados e mesmo mal organizados, ainda que sempre esforçadamente dirigidos.
A.C.R.
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