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2006/02/20

Memórias da minha Aldeia (22) 

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E que sabemos de mais concreto e preciso sobre Estanislau Xavier de Pina?

Existem ainda, em completa degradação, as ruínas do que se diz ter sido o solar da família em Várzea de Meruge, uma freguesia do concelho de Seia, já a pegar com o concelho de Oliveira de Hospital.

Estanislau de Pina terá nascido e vivido nesse solar que eventualmente seria a jóia dum património e rendimento importantes, a avaliar pelo que se pode presumir tenha gasto, do seu bolso, na luta contra os liberais, até à sua morte, em 1850.

Em 1829, terão começado a ser criados por todo o país os oficialmente chamados “batalhões de voluntários realistas”, com o propósito de “marcharem firme para a guerra santa e cujo fardamento lhes era facultado por fidalgos ricos”, faziam constar as fontes liberais.

É de presumir que, se não antes, a sua participação no recontro da ponte do Pindelo, com os milicianos de Feliciano, tenha feito reforçar em Estanislau de Pina o gosto e paixão pelo combate, de armas nas mãos, aos “liberais destruidores do Portugal de sempre”.

Muito possivelmente, Estanislau terá até percebido que não lhe seria a ele tão fácil e eficaz como a Feliciano mobilizar e enquadrar milicianos, que ao da Folgosa do Salvador eram familiares desde trinta e sete anos antes. Ter-se-á por isso interessado e entusiasmado com a possibilidade de encabeçar a criação e actividade, no concelho de Seia, de uma tropa nova e diferente, altamente militante, ou seja, um desses “batalhões de voluntários realistas”, naturalmente benquistos dos poderes do Estado miguelista.

Tanto mais, presumo, que Estanislau o faria do seu bolso.

E talvez não apenas quanto a fardamento…

Os liberais estranhariam este empenhamento pessoal dos aristocratas na defesa do regime, por não compreenderem que eles considerassem esse regime como factor decisivo de toda uma ordem social com que se identificavam como coisa intrinsecamente sua e una, não tolerando brechas nem cunhas.

É realmente incompreensível?

Difícil hoje de imaginar, pelo menos.

Mas, para compreendê-lo, talvez baste pensar que, já nesse tempo, não se consegue conceber um Feliciano Cruz a ver as coisas do mesmo modo que Xavier de Pina.

Creio que as reacções de Feliciano, por exemplo, já seriam então muito mais próximas do pensar burguês que do pensar monárquico-aristocrata de Estanislau de Pina…

E, no entanto, Feliciano não hesitou em arriscar a vida no recontro do Pindelo.

Mas talvez não arriscasse o património…

Será que a burguesia moderna – houve burguesia em todas as civilizações ocidentais – será que, com a burguesia moderna, aquilo que predominará virá a ser apenas o simples patriotismo?...

O facto, tudo parece indicá-lo, é que Estanislau Xavier deu cabo do património (mas também da vida, como se verá) nas suas aventuras bélicas. De tantos participantes nesta guerra de mais de vinte anos entre absolutistas e liberais só vejo um guerreiro ou guerrilheiro que tivesse sacrificado tanto ou mais que Estanislau: o Remexido, no Algarve e Alentejo.

Outra coisa é também certa, o exemplo de Feliciano não mais Estanislau o perdeu de vista ou afastou do seu coração, como aliás outros idênticos, que ele era altamente impressionável, sugestionável mesmo, como se depreende do não muito que se sabe da sua vida.

Fez a guerra pós-desembarque do Mindelo, entre miguelistas e liberais, como era natural que fizesse, isto é, batendo-se à frente do seu “batalhão de voluntários realistas”, como lhe era ordenado pelos generais do exército miguelista e como instrumento das estratégias e tácticas por eles e seus mandatários definidas.

Terminada, porém, formalmente a guerra, em 1834, com a rendição de D. Miguel e das forças militares miguelistas em Évora Monte, Estanislau Xavier de Pina não reconheceu a convenção, por ter sido extorquida ao Rei sob coacção, como aliás D. Miguel viria a alegar também.

Por isso, em vez de entregar as armas às forças vencedoras e em vez de dissolver o “seu” batalhão e de acatar a autoridade da Rainha D. Maria II, como fixado na convenção de Évora Monte, Estanislau transformou o seu batalhão numa força irregular, pronta para a guerrilha para que grande parte dos miguelistas irredentistas desde logo começou a preparar-se.

Foi seguramente com grande singeleza de argumentos e de respeito pelos princípios que, como voluntários do miguelismo, sempre tinham praticado e defendido, que Xavier convenceu e arrastou a sua pequena tropa.

E, agora, mais que nunca à sua custa…

Mas com um objectivo novo, ou talvez dotado duma vida nova e aureolado duma derrota agora idealizada, porque todos os militantes da guerra à “nova ordem” consideravam a derrota imerecida e injusta, mas certo o retorno à Pátria, em breve, de D. Miguel, outra vez vencedor como por duas vezes isso acontecera antes.

Sendo, para mais, o descontentamento popular maior agora que nunca!

Bastava observar a miséria em que as populações se achavam, em resultado dos gastos e sofrimentos da guerra.

E, por contraste, ver a riqueza e ostentação dos vencedores que já começavam a esfregar as mãos e a afiar os dentes para as grandes presas que os governos se preparavam para atirar-lhes às dentuças, como eram os bens dos conventos e dos nobres que se esperava viessem a ser devidamente espoliados.

A.C.R.

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