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2004/07/31

O espectáculo dilacerante da desorientação à esquerda (mas não só...) 

Faz agora três semanas — foi na noite de 09 de Julho corrente — que o Presidente da República deu uma estocada jamais vista no que era apenas o balão de vento das expectativas da esquerda.

Para disfarçar, insistem muito — é o caso do ex-P.R. Mário Soares — que Durão Barroso foi apenas a 3ª ou 4ª ou 5ª escolha dos “grandes” da Europa para Presidente da Comissão Europeia.

Esquecem só que D. Barroso foi desde muito cedo a escolha de dois desses quatro “grandes”, a Itália e o Reino Unido atlantistas.

Mas as velhas raivinhas de Mário Soares aos que vão ou ameaçam ir muito mais longe que ele, não perdoam.

Já um leitor, João Pereira dos Santos, em carta ao seu jornal, salientava “... o extremo estado de desorientação e de nervosismo em que a esquerda portuguesa se encontra.”

E acrescentava:

“... o caso é mesmo grave. Como foi possível, em tão pouco tempo, inverter uma situação em que o Governo parecia acossado e na defensiva, para ter agora um P.S. sem secretário-geral, um PCP e um Bloco de Esquerda furiosos, indignados, derrotados sem apelo nem agravo?”

“... a esquerda permitiu ao Governo dar a volta tranquilamente por cima e criou para si própria uma situação quase ridícula de derrota. O hara-kiri foi perfeito.” — concluía.

Mas claro que não desarmam, parece ser a sua única força.

E o Governo e Santana Lopes não podiam deixar de ser os bombos da festa.

Mário Soares outra vez, por exemplo, disse contra Santana Lopes e o Governo as piores brutalidades, a mais comedida das quais foi chamar “bizarro” ao segundo e repetidamente o equivalente de inepto ao primeiro.

Dor de cotovelo.

Mas há talvez pior.

Marcelo Rebelo de Sousa, na TVI, para tentar lançar germes de divisão dentro do novo Governo — como se o não conhecêssemos todos — até usou o veneno de que o nível dos secretários de Estado é superior ao dos ministros.

Para não deixar dúvidas, Marcelo R. de Sousa repetiu o que tem ouvido a outros das oposições dizendo que voltou a verificar-se a lógica que acontecera com os ministros, isto é, que não interessa para que cargo vai cada pessoa e se tem habilitações para ele, porque o que importa é que essa pessoa vá para o Governo.

Tudo sem se esquecer de também repetir a crítica, já então banalizada, como um passa-palavra, de que o novo Primeio-Ministro bem podia ter lido previamente o discurso de posse que lhe haviam preparado.

Pode supor-se que a insistência terá servido apenas para sublinhar esta última circunstância.

Um venenozinho de 3ª ordem, bem à maneira de M.R.S.

Este Governo tem, entre os seus ministros, um lote de seis a oito figuras de grandeza comprovada, como não creio tenha existido em qualquer Governo português dos últimos vinte anos, anterior a 2002.

O pavor que as oposições, e alguns elementos conhecidos como sendo do PSD, têm do poder de comunicação e sentido das oportunidades políticas do Primeiro Ministro, é tal que lhe recusam o habitual tempo de graça.

Esperam destruí-lo antes que o Dr. Santana Lopes se firme com toda a solidez no Poder que, por outro lado, dizem ter ele conquistado com diabólica arte.

Mas isto é uma arma que faz frequentemente ricochete.

Talvez o melhor trunfo do P.M. seja precisamente as contradições dos seus adversários.

Para lhe denegrir o poder de comunicação já alguns porém dizem que ele esteve irreconhecível no debate sobre o programa do Governo no Parlamento.

Não vi nem ouvi e, portanto, não posso fazer um juízo próprio, mas um alerta e uma recomendação poderão ser úteis: O Dr. Pedro Santana Lopes teve seguramente, pelo menos, três semanas infernais de trabalho, riscos, emoções, decisões difíceis e arrojadas tomadas em poucas horas ou poucos minutos, semanas como muito poucos políticos terão tido na vida.

Descanse algum tempo.

Os adversários vão continuar a não o poupar.

Mas ignore-os por uns dias e aproveite para um estágio que lhe ensine ou o treine para ignorá-los selectivamente, sempre.

Sabe melhor que todos que o seu Governo não é um Governo de paraquedistas, como titulava o Tal & Qual da semana passada, com a habitual grosseria.

Muitos pensamos que pode fazer do Governo uma excelente “orquestra”.

Seja o seu dinamizador e o maestro político dela.

Terá assim mais tempo e reservas morais e físicas para tudo.

António da Cruz Rodrigues (A.C.R.)

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