2005/09/13
Que esperar das reformas da ONU?
Quando, no dia 13 de Setembro, às 15.00h de Lisboa, se iniciar a 60ª sessão da Assembleia Geral da ONU, o mundo terá os olhos postos em Kofi Annan e nas reformas que promete, em George W. Bush, Condoleezza Rice, John Bolton e nas reformas que pretendem, no presidente iraniano Ahmadinejad, e ainda nos presidentes iraquiano e palestiniano.
Na agenda de Annan estarão propostas como a constituição de uma nova comissão intergovernamental de paz para evitar que as sociedades que emergem de conflitos se transformem em estados-fantasma, como sucede do Congo; ou a substituição da Comissão dos Direitos Humanos onde pontificam membros como a Líbia ou o Sudão, por um Conselho de Direitos Humanos, eleito e mais pequeno; uma definição de terrorismo, consensual, sem excepções para guerrilhas de libertação como as da Tchetchénia ou mesmo da Palestina (que pena terem-se lembrado disto com 40 aos de atraso...); as condições de aprovação de acções bélicas preventivas perante ameaças iminentes; a nova responsabilidade da ONU intervir em países soberanos para proteger civis de genocídios e outras atrocidades (Annan está convencido de que muitos países do Terceiro Mundo aceitariam esta ingerência na sua soberania se os países ricos lhes destinassem para ajuda ao desenvolvimento 0.7% do seu rendimento nacional) ; por fim, o alargamento do Conselho de Segurança, que após a intenção de aumentar de 15 para 24 elementos, conforme proposta de Março deste ano, provavelmente ficará pela entrada da Alemanha, Japão, Brasil e Índia, mantendo-se o direito de veto para os cinco do costume.
Do lado dos EUA, o maior contribuinte líquido para o orçamento da ONU (22%), as propostas de reforma centram-se em quatro áreas, definidas pela Secretária Rice: a importância do comércio e o combate à pobreza, o cumprimento da lei, aproximação ao mercado livre e redução da corrupção; a promoção da democracia e dos direitos humanos (George W. Bush durante a estadia em Nova York apresentará o “Fundo para a Democracia”); a segurança e o combate ao terrorismo (o Conselho de Segurança estudará uma resolução sobre incitamento ao terrorismo); por fim, a reforma institucional da ONU, que os EUA pretendem que seja profunda, de modo a tornar-se eficaz e transparente, com elevados padrões de integridade e competência.
Existem, apesar de tudo, diferenças notáveis entre o entendimento de Annan e o dos americanos no que toca às reformas. Para além de não ter grande credibilidade, nem margem de manobra, em consequência do caso de corrupção “petróleo por alimentos” e dos vários escândalos (abusos sexuais, exploração de mulheres) que envolveram pessoal da ONU – outro talvez já tivesse sido corrido há muito tempo – , Annan continua a apostar nas utopias do costume: que os 0.7% do rendimento nacional de cada país “rico” é que vão retirar da pobreza os povos do Terceiro Mundo (Ou será mais dinheiro para os bolsos dos seus governantes corruptos? Que é feito de tanto dinheiro vertido nesses países através de tantas ONG’s?); a definição de “ameaça iminente” e a obediência ao Conselho de Segurança, ainda que alargado (se fosse o novo Conselho de Segurança a chumbar a intervenção americana no Iraque, os EUA obedeceriam?).
Da parte americana há a destacar a confiança excessiva – para não dizer ingenuidade – relativamente ao sistema democrático para o Terceiro Mundo e o facto de ainda não terem mostrado claramente que já perceberam (se é que perceberam...) a importância actual das antigas potências ultramarinas europeias para a pacificação e a ordem em tantos países do Terceiro Mundo, especialmente em África, perante a multiplicidade de tribos e grupos étnico-linguísticos. É que, não é, sobretudo e à partida, uma questão de dinheiro ou de riqueza.
Com tudo isto, se se conseguir que a ONU deixe de ser o mentor ideológico da Internacional Socialista para o governo mundial, e seja aquilo para o qual foi criada – uma plataforma de entendimento entre as Nações com o objectivo de evitar as guerras, coisa que, como se tem visto, não é infalível – já não é nada mau.
De resto, não é de crer que haja grandes mudanças.
Manuel Brás
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