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2005/01/06

Eutanásia e utopias 

É a pretensão, associada a uma concepção holística e materialista, do homem se tornar dono e senhor absoluto da vida, própria e alheia, como se não a tivesse recebido, que está por trás de arbitrariedades como a legalização do aborto, da eutanásia, de manipulações embrionárias para utilidade alheia, etc. Enfim, há sempre homens que se sentem autorizados a dizer quem pode viver e quem deve morrer.

Não é, por isso, de admirar, que apareça alguém a fazer a apologia da eutanásia, inclusivamente chamando eutanásia aquilo que não o é.

Aplicar uma injecção letal a um doente para o matar é eutanásia. Desligar uma máquina quando se verifica que tal já não permite que o doente volte a realizar as funções vitais pelos seus próprios meios, não é eutanásia; é prescindir de cuidados terapêuticos extraordinários que se tornaram inúteis para a sua sobrevivência.

O móbil dos defensores da eutanásia é o medo do sofrimento e da dor, uma realidade da vida de todo o ser humano com que eles têm muita dificuldade em lidar: não lhe conhecem o sentido; é pena.

É pena, entre outras razões existenciais, porque desconhecem a prática dos cuidados paliativos que todos os dias é uma realidade na vida dos doentes terminais. É pena, porque desconhecem que o carinho e a dedicação de tantos e tantas profissionais de saúde, familiares e voluntários dão autênticas razões e sentido de vida a um doente terminal, que uma mente materialista não pode alcançar. É pena, porque desconhecem que os doentes que pedem a eutanásia o fazem por se sentirem sós e abandonados, não por estarem doentes; e, mesmo assim, só o pedem depois de insistentemente “mentalizados”. É pena, porque desconhecem que em países onde é mais forte a apologia da prática da eutanásia tem havido casos de pessoas eliminadas sem o pedirem.

Estamos perante uma guerra civilizacional, entre a cultura da vida e a cultura da morte, entre dois entendimentos inconciliáveis de homem, de vida e de mundo: um materialista, ateu, particularmente jacobino, o dos homens de 1789, e outro, aberto à transcendência, de cariz monoteísta, particularmente judaico-cristão, embora não exclusivamente.

O primeiro entendimento é protagonizado pela ética planetária inventada pelos iluminados socialistas da ONU durante os anos 90, tais como Bill Clinton, Al Gore, Gro Harlem Brundtland, Nafis Sadik, etc, e posta em prática pela equipa de Kofi Annan desde 1997. É daqui que vêm os vocábulos, frequentemente equívocos, que os políticos – socialistas, a diesel e não só – papagueiam aos microfones: consenso (pensamento único), governação (governo mundial em detrimento das soberanias nacionais), saúde reprodutiva e direito de escolha (aborto, controle da natalidade, homossexualismo, eutanásia), consciência ecológica (igualdade radical, também nos direitos, de todas as formas de vida, cuja totalidade é representada pela Terra, que é sagrada, o grande todo e fonte de toda a vida), o desenvolvimento sustentado, etc. É também daqui que vêm os recentes escândalos de corrupção, de assédio e abuso sexual de que a equipa de Kofi Annan é acusada pelos próprios funcionários da ONU.

O segundo entendimento é protagonizado pelas religiões monoteístas – Judaísmo, Cristianismo e Islamismo: a vida e o mundo como criação e dom do único Deus, perante quem, cada homem, criado à sua imagem e semelhança, é responsável, que se manifesta na vida e na História dos homens com um desígnio salvífico. Dizer que a Igreja quer impôr normas de conduta universal, tal como a ONU também quer, não é mentir, mas é ficar muito aquém. O mais perverso é querer impôr uma ordem social jacobina e ateia, vontade de uma minoria de iluminados, a uma maioria de crentes das religiões monoteístas. Será certamente a eclosão de uma religião terrena e política.

A morte só é uma injustiça para quem não vê mais longe que a caducidade da vida presente. Mas como todos concordam que é inevitável, então não pode ser injustiça, é condição. Há uma maneira inútil de a tentar iludir, que é acreditar na utopia do paraíso terreno: alguns passam a vida inteira a laborar nesse erro. Eu é que não tenho pachorra para ser mainstreamed pelo Kofi Annan.

Manuel Brás

manuelbras@portugalmail.pt

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