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2008/06/26

Inesperado Surto de Proto-Fascismo dos Camionistas (4) 

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Notícias destas coisas, levadas por informadores diversos ao gabinete do Primeiro-Ministro, como aos gabinetes de alguns Ministros mais abelhudos, acabaram por suscitar por fim interesse e alarme no governo. Creio ter sido a partir dos alarmes lançados de Coimbra pelo governador civil, um velho perito político de extrema-direita, que todos os regimes empregavam.

E já não seria sem tempo, criticavam os que sabem como é perigoso, altamente arriscado, deixar esquemas destes desenvolver-se sem controlo algum, ao menos para se obterem informações de confiança, como nos “bons tempos” eram as da Pide, não deixavam de assinalar certos especuladores.

Mas o governo mostrava-se adormecido e, quando acordado, como que indiferente. De facto, o governo confiava cegamente na força e efeitos automáticos das leis condenatórias do Fascismo.

O governo achava porém que não era da sua competência intervir, mas sim do Ministério Público, visto que a propaganda de ideias fascistas era um crime público, competindo àquele denunciá-lo e persegui-lo perante os Tribunais.

Mas o novo “Duce” dos camionistas entendia, com um especial sentido como que divinatório, que nenhum governo – todos a seus olhos, por definição, muito estúpidos e preguiçosos – se atreveria a atacar a liberdade dos portugueses por aderirem e praticarem as verdades preferidas de cada um.

Assim aconteceu, de facto, durante algum tempo, deixando aos camionistas e seus aderentes e simpatizantes plena liberdade de movimentos, não fossem eles outra vez mobilizar-se e porem em risco sobretudo o abastecimento em géneros alimentares da população, ameaçando-a de escassez crescente de tudo e de fome generalizada, por fim.

A chantagem paralisava o governo de novo, tornado rapidamente de todo inoperante, pior ainda, completamente descrente das suas possibilidades de reacção eficaz e a tempo.

O “Duce” desatou imediatamente a utilizar as plataformas de diversos camiões para multiplicar as suas arengas por todos os cantos mais remotos do País inteiro que, dia a dia, ficava mais convertido ao fascínio desse novo “Duce” incansável e cuja eloquência ganhava de semana para semana novas tonalidades. Ora mais acertadas com as realidades, ora mais sedutoras para todos os descontentes e todos os que ansiavam por ver o País “dar uma volta” e mesmo muitas voltas sucessivas, que se fossem completando umas às outras…

Talvez até ao enterro final.

De todos os Países da União Europeia acabaram também por começar a chegar avisos alarmantes, mas acompanhados por aquilo que afinal os neutralizava, isto é, por advertências de que, acima de tudo, era preciso respeitar a liberdade dos cidadãos para escolherem como queriam ser governados e segundo que ideias ou ideais, incluindo sem ideias nenhumas e ideais ainda menos.

O Primeiro-Ministro, a certa altura, pensou ter descoberto a pólvora para reduzir tudo aquilo a nada, até a menos que nada, “se Deus quisesse”. Como gostava de repetir, para exibir o seu proclamado respeito pela Fé de todos e cada um e sobretudo, a largueza de compreensão para com todos os eleitores, paredes meias com todas as verdades e a alinhar com as crenças dum número enorme e a crescer com fausta regularidade, apesar de os nascimentos em Portugal serem tendencialmente sempre para menos que os mortos.

Se não fossem os imigrantes…

Mas o Primeiro-Ministro gostava de esconder para si próprio a maior parte das inspirações luminosas que lhe acudiam, de modo que jamais se veio a saber que “descoberta da pólvora” era aquela, encerrada num misterioso “se Deus quiser e os homens deixarem”.

A.C.R.

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