2004/07/12
A "Horrível Noite"
Chamou assim o deputado PS, António José Seguro, à noite de hoje, 9 de Julho de 2004, uma noite que jamais esquecerá, por efeito da "trágica" opção do Presidente da República de decidir contra a antecipação das eleições legislativas e a favor do convite a Santana Lopes para formar Governo.
Estava com outros quatro representantes partidários, no debate organizado pela RTP1, quando também já se sabia da demissão de Eduardo Ferro Rodrigues do Cargo de Secretário-Geral do P.S.
A Noite da Maior Derrota da esquerda desde o 25 de Abril
Mas, além de "horrível" para o P.S., talvez a noite fique, também, como a noite da maior derrota desde o "25 de Abril” para toda a Esquerda portuguesa.
Sobretudo por todos os representantes da Esquerda derrotada se terem apresentado com péssimo perder.
As grandes derrotas políticas não têm que vir em directo, necessariamente, por via de eleições, mas simplesmente por força do poder efectivo de indivíduos, grupos ou instituições que tomam as grandes decisões.
A Noite das grandes Frases também
Já o tínhamos aqui largamente recordado e explicado, ultimamente... sem querer ser profetas.
Ganhar eleições, ao modo como a esquerda em Portugal ganhou as europeias, pode não passar de profunda derrota.
Foi, aliás, uma noite de grandes frases.
Outra delas foi a de Ferro Rodrigues com que se despediu do país, na qualidade de Secretário-Geral do P.S.
Disse ele que se demitia por considerar-se o grande derrotado, no confronto com o Presidente da República, responsável "pessoal e político", portanto, pela derrota que o P.R. infligia a todo o P.S., como se sabe defensor acérrimo da antecipação das legislativas.
Eleições, já! — como clamariam antigamente os partidos do B.E.
E o Bom do A. J. Seguro Corroborou
A decisão do P.R. também a ele o deixou decepcionado.
Também para ele foi uma "derrota pessoal e uma enorme decepção", pois nunca pensara que o P.R. decidisse outra coisa que a antecipação das legislativas.
É bom haver na Política (ou na política?) rapazes assim ingénuos e tão puros ou inocentes que vêm revelá-lo publicamente.
O bom do A. J. Seguro (excessivamente e injustificadamente seguro, como provou) não teve uma dúvida e não chegou a perceber que o P.S. não tinha dado ao P.R. senão razões meramente subjectivas para apoiar a decisão que ao P.S. agradava e pela qual lutou encarniçadamente.
Mas Houve Também Frases Mais Espirituosas
Foi-o particularmente aquela que Ana Gomes, deputada do P.S., contou essa noite na RPT1 por ter acabado de recebê-la por telemóvel dum seu amigo, género humorista mórbido.
"Finalmente — terá dito o amigo à Ana Gomes — a Direita tem aquilo porque sempre lutou: Uma maioria, um Governo e... um Presidente".
Essa noite os socialistas não pouparam o seu Presidente em nenhuma ocasião de achincalhá-lo.
Esta do telemóvel foi apenas a mais despudorada.
A Ana Gomes bem aproveitou para assumidamente achincalhar o Presidente repetindo a graçola do outro.
Se é que não a inventou ela...
Mas Talvez só Mestre Rosas Tenha Chegado ao Requinte...
Disse ele, sorridentemente furioso com o Presidente da República, com a sua habitual pseudo-subtileza, que o P.R., iludindo as expectativas da "grande maioria do povo português" — ele, Rosas, tem um dedo que lhe adivinha tudo... — entregara à Direita, de mão beijada...
Entregara o quê?...
"A taluda!"
Sim, a taluda.
Para o bom do mestre Rosas o Poder ainda é visto como é imaginado por qualquer simplório ou invejoso que nunca o teve ou que há muito está afastado dele:
A taluda!
É do primarismo mais lastimável.
Do Poder parece não ver outra coisa que benesses, privilégios, exterioridades, lantejoulas, talvez gozos de perder a cabeça.
O “Poder” dos Ambiciosos Frustrados
Não lhe bastará a ele, Rosas, o poder, elementar que seja, por que se calhar muitos anos lutou, o poder de "passar" e "chumbar" alunos de todos os dias.
A sofreguidão do poder a todo o custo que transpiram todos estes ambicioso frustrados por uma derrota que não esperavam e sempre, pelos vistos, tinham considerado impossível.
Na verdade são castigados apenas pela sua própria ignorância, vaidade e presunção.
Arriscaram tudo imponderadamente e tudo perderam, sem por um momento só terem aparentemente reflectido que, com a sua obstinação, acabariam por dar ao Governo a maior vitória de sempre, mas fazendo-o ganhar uma aposta que, de tão arrojada, à partida se apresentava inevitavelmente perdida para o Governo.
Poderá o Governo vencer o jogo em que se meteu?
Agora o jogo que o Governo conceber e executou parece já mais arriscado em Bruxelas e em Lisboa, onde pelo menos se clarificou o jogo e abriu perspectivas que deixaram de ser sombrias.
O grande sobressalto que todos sofremos talvez tenha vindo de subitamente ter deixado de perspectivar-se como possível um programa de Governo até 2010.
Subitamente também — mas quanto trabalho subterrâneo isso terá custado! — tal perspectiva de governação de longo fôlego, e o fôlego certo, voltou a brilhar para os Portugueses.
Assim seja!
Santa Cruz, 9 de Julho de 2004
A.C.R.