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2006/09/06

Fim do neoconservadorismo? 

Discutia-se há dias no blogue da revista “Atlântico” se o neoconservadorismo tinha chegado ao fim ou não. Não é hipótese que já não tenha sido ventilada em certos jornais, suplementos ou revistas.

A razão seria um suposto falhanço dos objectivos militares e políticos no Iraque e no Afeganistão, enfim, um suposto falhanço da Administração americana na guerra contra o terrorismo, ainda para mais, e embora os EUA não estejam directamente envolvidos, num momento em que Israel, um aliado dos americanos, não conseguiu riscar o Hezbollah do Sul do Líbano, coisa que Ahmadinejad quer fazer a Israel.

Nós, os ocidentais, em particular europeus, julgávamos que era chegar, ver e vencer. Queríamos uma vitória rápida, tal como se devora um hambúrguer ou uma pizza. Se as coisas demoram mais tempo desanimamos, desistimos, não somos capazes de pensar e de viver a longo prazo, com perseverança, como exige o choque civilizacional que estamos a enfrentar e a nossa própria sobrevivência e continuidade. Estamos, antes de mais nada, perante um problema de moral, de coragem, que retomarei noutro postal.

Mas, independentemente da evolução das campanhas no Iraque e no Afeganistão, o que têm a ver com o neoconservadorismo? Ao fim e ao cabo, o que é que pinta o neoconservadorismo nas intervenções militares americanas? Será que se o presidente dos EUA tivesse outros conselheiros no staff não invadiria o Iraque nem o Afeganistão? Será o neoconservadorismo uma teoria da guerra? E quando os EUA entraram na II Guerra Mundial e no Vietname, será que também havia neoconservadores no governo?

Mas, afinal de contas, o que é o neoconservadorismo? O que é um neoconservador?

Este movimento teve origem num conjunto de intelectuais e académicos desiludidos com as utopias do socialismo e, depois, com as utopias do liberalismo, e consequentemente cépticos e críticos de todas as promessas do Estado providência e do paraíso na terra.

Irving Kristol, considerado o pai deste movimento, fez uma trajectória política deste jaez. Socialista radical (trotskista) na juventude, desiludiu-se com a esquerda e tornou-se o bastião do movimento anticomunista quando a União Soviética era o que estava a dar, passando por um longo período liberal, relativamente ao qual se tornou progressivamente céptico e crítico. Dizer que Kristol passou grande parte da vida a criticar o socialismo e o liberalismo não é mentir, mas é ficar aquém da realidade, porque, de facto, soube rodear-se de uma das mais preciosas gerações de intelectuais, professores universitários, escritores e artistas.

Ao superar as utopias socialistas e liberais, os neocons abriram as portas à realidade, com todas as limitações e contingências inerentes à condição humana e a um mundo imperfeito. Podemos assim dizer que abriram as portas da política ao realismo da condição humana e às estruturas históricas da sociedade, tais como a família, as associações profissionais e culturais, os municípios, a Nação, em detrimento de utopias e abstracções.

O que é que os neocons têm a ver com o conservadorismo tradicional?

Pouco ou nada.

Em primeiro lugar, pela sua origem intelectual de desilusão com a esquerda e suas utopias, ao passo que o conservadorismo tradicional, intelectualmente muito restringido à economia e às finanças, sempre experimentou uma grande dificuldade em pensar, mais ainda na Europa.

O movimento neocon introduziu no conservadorismo tradicional americano a dimensão intelectual e a base argumentativa, que é a alma de qualquer movimento cultural e político, sem a qual, pura e simplesmente, não existe.

Em certo sentido o movimento neocon é a antítese do conservadorismo tradicional, na medida em que intelectualiza a realidade da condição humana e do mundo.

Um neoconservador é, no dizer de Kristol “a liberal mugged by reality”, ou seja, um liberal inserido na realidade.

Em termos práticos, o neoconservadorismo conferiu uma vitalidade intelectual e argumentativa ao conservadorismo tradicional, iniciada nos anos 60, que esteve na base da eleição de sete dos dez últimos presidentes americanos. Não é, portanto, uma invenção de última hora destinada a justificar a intervenção militar no Afeganistão, no Iraque, ou onde quer que seja. O neoconservadorismo não é uma teoria justificativa da guerra. É um enriquecimento da mundividência conservadora.

Em todo o caso, na América existem várias correntes conservadoras, que têm uma base alargada de causas comuns e algumas diferenças. Para além dos neoconservadores e dos conservadores tradicionais, existem os compassive conservatives ou os partidários do America first. Nem todos, evidentemente, a favor da intervenção no Iraque.

Manuel Brás

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