2006/05/09
Porquê e para quê o “Don Quixote de La Mancha”?
A auto-destruição de Espanha?
Já li as primeiras 700 pgs das 1200 da última edição em português do “D. Quixote de La Mancha”, que comprei há pouco, na tradução de Aquilino Ribeiro, a qual se me afigura formidável, embora considerada por alguns muito livre.
Estará ali espelhada a natureza profunda do Espanhol e do povo espanhol, sobretudo talvez se os considerarmos na sua natureza dominante, a natureza castelhana?
Li o “D. Quixote” há muitos anos e não me entusiasmou.
Desta vez julgo sentir, como poucas vezes, a genialidade de Cervantes a espreitar e exibir-se sem rebuço, a todo o instante.
Mas o que queria dizer o autor? – pergunta que me assalta desde o começo e que se me vai repetindo ao longo da leitura, cada vez com mais insistência.
Cedo se me impôs a ideia de que não se terá tratado simplesmente de fazer a crítica da literatura e instituição da cavalaria andante, crítica que poderia andar havia muito na cultura do tempo.
Talvez esse bota-abaixo bem transparente não passasse de pretexto para profunda interpretação do Espanhol e de Espanha, dominadas orgulhosamente por Castela.
Como assim?
Não me lembro de alguma vez ter lido uma apreciação crítica da obra que fundamente as ideias que sobre ela me vão surgindo e clarificando. Mas parece-me, com crescente evidência, que Cervantes nos quer fazer ver Espanha e os Espanhóis a uma luz persistentemente, direi… direi desconfortável. Como se fossem constituídos, Espanha e os Espanhóis, por duas doses diversas, muito diversas, mas estranhamente convergentes: os da loucura quixotesca (D. Quixote e também o seu escudeiro Sancho) e os outros, os que toleram os primeiros, com eles convivem normalmente, os estimulam mesmo e lhes criam ambiente propício.
Uma espécie de conúbio inimaginável e nada saudável.
Porque será que a desconfiança em relação a Espanha e aos Espanhóis me vai nascendo ou renascendo ao longo da leitura, como se a configuração deles e dela que referi se impusesse ou fosse desenvolvendo imparavelmente enquanto leio?
Não, não julgo que dali ressalte uma visão recomendável de Espanha e dos Espanhóis, para quem pretenda manter-se ou tornar-se simpatizante de Espanha e dos Espanhóis.
Mas os Espanhóis parece reverem-se nessa visão com orgulho, como nós nos Lusíadas, publicados trinta e três anos antes. Nenhuma relação entre as duas obras, nem entre os espíritos de uma e da outra. Estará a Espanha a autodestruir-se, como creio que Cervantes de algum modo lho augurava?
A.C.R.
Estará ali espelhada a natureza profunda do Espanhol e do povo espanhol, sobretudo talvez se os considerarmos na sua natureza dominante, a natureza castelhana?
Li o “D. Quixote” há muitos anos e não me entusiasmou.
Desta vez julgo sentir, como poucas vezes, a genialidade de Cervantes a espreitar e exibir-se sem rebuço, a todo o instante.
Mas o que queria dizer o autor? – pergunta que me assalta desde o começo e que se me vai repetindo ao longo da leitura, cada vez com mais insistência.
Cedo se me impôs a ideia de que não se terá tratado simplesmente de fazer a crítica da literatura e instituição da cavalaria andante, crítica que poderia andar havia muito na cultura do tempo.
Talvez esse bota-abaixo bem transparente não passasse de pretexto para profunda interpretação do Espanhol e de Espanha, dominadas orgulhosamente por Castela.
Como assim?
Não me lembro de alguma vez ter lido uma apreciação crítica da obra que fundamente as ideias que sobre ela me vão surgindo e clarificando. Mas parece-me, com crescente evidência, que Cervantes nos quer fazer ver Espanha e os Espanhóis a uma luz persistentemente, direi… direi desconfortável. Como se fossem constituídos, Espanha e os Espanhóis, por duas doses diversas, muito diversas, mas estranhamente convergentes: os da loucura quixotesca (D. Quixote e também o seu escudeiro Sancho) e os outros, os que toleram os primeiros, com eles convivem normalmente, os estimulam mesmo e lhes criam ambiente propício.
Uma espécie de conúbio inimaginável e nada saudável.
Porque será que a desconfiança em relação a Espanha e aos Espanhóis me vai nascendo ou renascendo ao longo da leitura, como se a configuração deles e dela que referi se impusesse ou fosse desenvolvendo imparavelmente enquanto leio?
Não, não julgo que dali ressalte uma visão recomendável de Espanha e dos Espanhóis, para quem pretenda manter-se ou tornar-se simpatizante de Espanha e dos Espanhóis.
Mas os Espanhóis parece reverem-se nessa visão com orgulho, como nós nos Lusíadas, publicados trinta e três anos antes. Nenhuma relação entre as duas obras, nem entre os espíritos de uma e da outra. Estará a Espanha a autodestruir-se, como creio que Cervantes de algum modo lho augurava?
A.C.R.