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2004/02/27

O aborto visto de cima 

Quando as pessoas se questionam surpreendidas como é que foi possível chegar às matanças do séc. XX – uma muito mediatizada e outras habilmente ocultadas à procura de melhores dias – talvez essa surpresa se deva a uma visão utópica da condição humana, que as leva a ignorar como é fácil iludir e justificar as maiores atrocidades, pelo simples facto de que os homens são capazes de justificar tudo o que quiserem, sobretudo quando se erguem como juízes do bem e do mal.

Ora, é precisamente isso que a esquerda
– que domina a arte da mentira e do ocultamento – tem feito nos últimos 50 anos em Portugal. Partindo do princípio de que os homens nascem com asas nas costas – especialmente se forem de esquerda – nada de mal podem fazer por sua culpa; se algum mal fazem a culpa é da sociedade e das suas estruturas, tais como a família, a Igreja, as forças de segurança, a instituição militar, enfim, tudo o que suponha hierarquia e autoridade. Essas, sim, são as estruturas que fazem os homens maus e devem ser eliminadas para que se possa erguer o “homem novo”.

O aborto é uma das frentes predilectas da esquerda, a par do homossexualismo e da droga. Com a escassez de proletários e de camponeses (a reforma agrária deu no que deu...) e uma classe dirigente que não dispensa as delícias de Cápua, a esquerda teve de encontrar o seu novo paradigma.

Posta de lado a argumentação sobre o aborto clandestino – que eles sabem que nunca irá acabar, porque as mulheres que a ele recorrem querem mesmo ocultar o seu estado de gravidez e que não lhe façam perguntas – o novo raciocínio que preconiza a despenalização do aborto à la carte até às 10 ou 12 semanas é cristalino: como as mulheres que abortam nascem com asas nas costas, de forma alguma podem matar os próprios filhos, portanto, o aborto não é crime. Como tal, se ao fim de 12 semanas uma mulher quiser despachar o que traz na barriga pode fazê-lo, pois não se trata de um ser humano. No entanto, se quiser levar a gravidez até ao fim, então aí já tem na barriga um ser humano. Não é maravilhoso? O atributo de ser humano é fixado pelo arbítrio da vontade.

É claro que se a esquerda conseguiu chegar onde chegou foi porque a direita – particularmente os políticos – foi criada à sua imagem e semelhança para servir de alavanca. Com a ingenuidade, a moleza e a buçalidade intelectual que a caracteriza, a direita comeu sempre muito bem as tretas da APF, tais como o mito da penalização das mulheres, quando o que, de facto, pretendem é proteger os “profissionais” carniceiros da máfia abortista, e a ideia de que o aborto quando realizado em estabelecimento legal não tem consequências para a saúde das mulheres, quando se sabe que há maior incidência de cancro na mama e depressões entre mulheres que abortaram.

As contradições da esquerda são mais que muitas. Porquê pôr o limite legal para aborto livre às 10 ou 12 semanas? Porque não às 24 ou 36? Se não é crime... Dizem que não há direito uma mulher ir a tribunal por abortar. Então e há direito uma mulher ir a tribunal por roubar, traficar droga, fugir aos impostos ou matar a mãe? Condenam a violência doméstica como crime, mas querem absolver o caso extremo de violência doméstica, em que uma mulher, mais ou menos pressionada, recorre a um carniceiro para que lhe mate o filho. Para eles é mais grave levar uns estalos do que ser triturado.

E se um indivíduo – desses que não gosta de mulheres grávidas – agredir uma mulher grávida de 12 semanas na barriga e lhe provocar um aborto, comete crime de homicídio ou não?

Após tantos anos de ditadura cultural e política de esquerda, já devíamos ter aprendido que as soluções deles são sempre piores que os problemas.

É claro que eles sabem que estas coisas vão por partes: os que querem agora o aborto livre até às 10 ou 12 semanas foram os mesmos que aprovaram a actual lei há 20 anos, em nome da tolerância e da modernidade; daqui por poucos anos vão querer alargar o aborto até às 20 ou 24 semanas, invocando a mesma tolerância e os progressos da medicina, com a desculpa de que 12 semanas é pouco tempo para dar vazão à demanda nos serviços de saúde, que não estão preparados para tanta exigência. E por aí fora.

Eliminar as práticas abortivas da lista de crimes é abrir caminho para a sua banalização e para outras práticas de morte tais como a eutanásia, a instrumentalização e a morte de embriões para benefício de terceiros, enfim, é abrir o caminho para as novas câmaras de gás a todos aqueles que os iluminados acharem que não são dignos de viver.

Se descriminalizar as práticas abortivas é condenável, mais condenável é dispor de estruturas hospitalares, concebidas para conservar a vida humana, e instrumentalizá-las para a sua destruição arbitrária, ou seja, porque dá jeito.

Será que os hospitais, que não conseguem dar vazão a tantas cirurgias há anos em lista de espera, vão atrasar ainda mais os seus serviços para dar prioridade aos abortos?

Existem dois caminhos para ajudar as mulheres com gravidezes problemáticas: ajudá-las a aceitar a gravidez e a maternidade ou ajudá-las a despachar o que trazem no ventre. A esquerda prefere a última e condena os que que preferem e praticam a primeira.

A esquerda é assim: é canha, torta, sinistra... é esquerda.


Manuel Brás
manuelbras@portugalmail.pt

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